De Ana Beatriz Almeida.
“O mundo é a jornada, lar está para além dele”
Provérbio Vodoun
A jornada da multi-artista Beyoncé Knowles-Carter com o Oeste Africano começa antes do que se possa ver. Em 2013 ela já trabalhava com o co-diretor de sua obra mais recente, “Black is King” (2020), o ganês fante Kwasi Fourdjour na obra “Drunk in Love”. Ele é um dos responsáveis pela aproximação entre África e diáspora nas referências culturais presentes no trabalho da artista ao longo dos anos. É de autoria dele o time diverso de co-diretores responsáveis por conectar as diferentes culturas africanas numa narrativa comum: os ganeses Emmanuel Adjei e Blitz Bazawule e os nigerianos Jenn Nkiru e Ibra Ake.
Elegante, a dupla inicia a obra “Black is King” introduzindo o espectador a Áfricas diferentes: o deserto com seus povos nômades – com referência direta aos tamashekis e massais; a bacia do Sudão (ou o sul da África), caracterizada pelas savanas; e a África ocidental, tropical, com rios e cachoeiras, terra dos ewe, yorubas e fantes. Ainda que seja impossível dar conta de toda vastidão de culturas do continente, as primeiras imagens da obra deixam nítida a mensagem de que não existe apenas uma África.
A obra, narrada por ritos, inicia-se com a voz de Beyoncé, que surge em off nos primeiros segundos de “Black is King” e faz referência ao ritual de nascimento da etnia Zulu, algo que também foi feito no filme original “O rei leão”. Os zulus estão em grande parte na África do Sul e suas tradições integram a cultura afro-brasileira de influencia Bantu. Os lideres humanitários Nelson Mandela e Zumbi dos Palmares, bem como a artista visual Helen Sebidi, são exemplos de exponentes zulus relevantes para a modernidade. Na narrativa de Beyoncé, o herói Black é original desta etnia e, havendo nascido rei, seu nascimento é marcado pelo ritual de reconhecimento dos ancestrais. Assim como no candomblé, a cor branca aparece como referência aos antepassados, que segundo a lógica zulu habitam o mar.
Podemos observar uma intersecção com a cultura ewe, presente na Nigéria, Benin, Togo e Ghana. Segundo as culturas zulu e ewe, a cabaça representa o feminino. Para os ewe, o mar é símbolo do desconhecido e do impenetrável, eles o chamam de Hú, uma força sobrenatural – que aparece no inicio do ritual de iniciação com uma cabaça cortada ao meio – representada por um dançarino azul turquesa que acompanha Beyoncé em diversos momentos ao longo da obra.
Grupo etno-linguístico africano que configura como o primeiro a ser escravizado e trazido para o Brasil.
Artista sul-africana que tomou parte da primeira edição da Death & Life Residency (2019).
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